Enquanto o céu começava a se alaranjar, ela, deitada sem pudores na areia, respirava o aroma de flores secas e vidas novas e outros tempos. Seus olhos azul faiscante confundiam-se com a paisagem, tão pesadamente ela a absorvia e admirava, e com o fluxo entre pessoa e mundo as janelas de sua alma também tomavam sutil tom alaranjado. Certo número de pessoas mais próximas já o haviam visto acontecer, e diziam-lhe que tinha olhos de brasa, e que quanto queimavam dessa maneira, ao pôr do sol, ela ficava tão deslumbrante e magnífica que nem um rei teria coragem de negar-lhe qualquer coisa – de fato, seus olhos lhe concediam grande poder. Contudo, carregar chamas nos olhos às vezes a queimava por dentro. É a rabugenta velha armadilha, o paradoxo da luz, seu último desafio: brilhar sem queimar. Ela era tão imensa por dentro que transbordava, e a lava que escorria era tanto mágica quanto venenosa. Sua sina era buscar o equilíbrio, o ponto onde seus olhos poderiam absorver cada gota de mundo e fogo, sem que ela toda ardesse em chamas.
O sol se pôs e ela deu um mergulho no mar para aliviar a histeria silenciosa de todos os seus próprios sóis que ainda não se haviam posto.
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